Pelas ruas da Rússia, a expressão da saudade

Pelas ruas da Rússia, a expressão da saudade

Colunista volta ao ano de 1998, para relembrar o sentimento que passou a fazer sentido em sua existência.

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06 Dezembro 2017 – Diário de Santa Maria

 

Colunista volta ao ano de 1998, para relembrar o sentimento passou a fazer sentido em sua existência.

 

Fim de julho. 20 anos de idade. 1998. Moscou. Estava em Moscou há mais de 20 dias. Moscou é uma bela cidade. Grandiosos monumentos. Pontos turísticos famosos: a Praça Vermelha, o complexo do Kremlin, o teatro Bolshoi e a catedral de São Basílio.

A temperatura estava agradável. O sol refulgia no céu límpido, as árvores pareciam mais verdes, e as flores mais alegres a sua benéfica influência. Era manhã – uma clara e balsâmica manhã de verão. O menor das folhas e o mais diminuto dos talos de grama palpitava de vida. Os pássaros cantavam nos ramos. A borboleta, revoluteando, aquecia-se aos cálidos raios do sol; miríades de insetos estiravam as asas transparentes e gozavam a breve, posto que feliz existência. Caminhava tranquilamente. Meu sonho, meu desejo se cumpria: conhecer a capital da Rússia. Estava maravilhado e em êxtase. Nada escapava ao meu olhar. Tudo era brilho e esplendor.

A Rússia sempre me encantou pelos escritores, músicos e a formidável história de luta, revolução e guerras. Relembro que nossos guias turísticos – fui para estudos com um grupo de alunos de Relações Internacionais da Pontifícia da Universidade de São Paulo – eram de origem chechena. Muitos deles eram órfãos da guerra entre Rússia e Chechênia. E tinham sido adotados por famílias russas. 

Depois de dias de curso sobre a Rússia no período de transição no Instituto da Latinoamérica da Academia de Ciências da Rússia ainda faltavam alguns dias para o retorno tão esperado.

 

Fotos: José Renato Silveira (Arquivo Pessoal)/

 

A volta pra casa 

  A saudade de casa ecoava dentro de mim. Naquele momento, fez sentido os versos do poetinha Vinicius de Moraes no poema Pátria Minha:


“Se me perguntarem o que é a minha pátria, direi: Não sei. De fato, não sei

Como, por que e quando a minha pátria

Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água

Que elaboram e liquefazem a minha mágoa

Em longas lágrimas amargas”.

 

Quase dois meses fora de casa me deram uma nostalgia. E comecei a entender o que significa saudade. Saudade. Sentimento paradoxal. Misto de alegria e tristeza. Que causa risos e lágrimas. Que provoca, irrita, inspira e relaxa. Que desperta lembranças. Como é gostoso o cheiro das lembranças. As lembranças têm cheiros. O impacto emocional que um aroma é capaz de provocar pode nos marcar para sempre.

Para o escritor francês Marcel Proust, o resgate da lembrança da infância é composto por chá com Madeleine, como confidencia ao recorrer à memória olfativa no primeiro dos setes volumes de Em busca do Tempo Perdido. Por fim, aceitar a transitoriedade da vida é o segredo para sentir uma saudade boa. Nossa vida é repleta de chegadas e partidas. O ano começa e termina. Os amores vêm e vão. Amigos surgem e desaparecem. Cursos se iniciam e acabam. Festas e viagens têm começo e fim. Deixamos e carregamos dentro de nós tudo o que vivemos, em cada ciclo que fechamos.

 

Fotos: José Renato Silveira (Arquivo Pessoal)

 

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